
Pelo fato de originar-se em Deus, a Lei reveste-se de santidade e graça, assim como Deus é santo e misericordioso; “Porque povo santo és ao Senhor teu Deus” e “Mas porque o Senhor vos amava... vos tirou com mão forte e vos resgatou da casa da servidão”, Dt 7.6-15.
Nos tempos do Velho Testamento não se conhecia nenhuma divisão entre as leis profanas e religiosas, ou entre mandamentos morais e cerimoniais. A Thora era um todo, abarcando plenamente a vida da nação e de cada indivíduo. Para isto alternam-se os tratamentos “vós” e “tu”, a declararem como válidos e verdadeiros, tanto para o povo como para o indivíduo, todos os preceitos nela contidos.
Por outro lado, a Lei, como a primeira divisão das Escrituras Sagradas, ou seja, o Pentateuco é predominantemente negativa. De suas 613 ordenanças, 365 são proibições, segundo revelam os rabinos israelitas. É o caso do Decálogo, onde oito dos dez mandamentos são iniciados por um “não”.
Sua Unidade
A unidade da lei apareceu em o Novo Testamento de forma eloqüente, mesmo quando se faz alusão a divisão “tripartite” das Escrituras hebraicas: na lei de Moisés, e nos profetas e nos Salmos (Lc 24.44), onde “lei” são os cinco primeiros livros bíblicos, escritos por Moisés. Em outras passagens “Lei” e “lei e Profetas” referem-ce a todo o Velho Testamento, como sendo a máxima expressão da imperativa vontade divina para seu povo, Israel.
Em se tratando especialmente do Pentateuco, é flagrante a impossibilidade de se distinguir duas leis – uma moral e outra cerimonial, uma cumprida por Cristo e outra cumprida por nós – sem torcer violentamente todo o ensino neo - testamentário (onde Thora aparece quase sempre no singular) e trair o princípio divino da justificação pela fé, tal como ele nos é apresentado em toda a Bíblia Sagrada. Jesus e os escritores da Nova Aliança citam passagens de Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio, além de outros livros vetero - testamentários, designando-os da “lei”. Vejamos os seguintes casos:
O apóstolo Paulo ensina que “as mulheres estejam... sujeitas, como também ordena a lei”, e apontando o livro de Gênesis (1Co 14.34; Gn 3.16). Aos romanos, escreve: “...se a lei não dissesse; não cobiçarás...”, referindo-se a Êxodo e Deuteronômio (Rm 7.7; Êx 20.17; Dt 5.21).
Jesus, ao ser interrogado acerca do grande mandamento da Lei, citou os livros de Levítico e Deuteronômio (Mt 22.36-39; Lv 19.18; Dt 6.5). Em outra ocasião afirmou: “Não tendes lido na lei?...”, referindo-se ao livro de Números (Mt 12.5; Nm 28.9,10).
Portanto, segundo o Senhor Jesus e o apóstolo Paulo, todos os livros do Pentateuco são “Lei”, não fazendo eles nenhuma distinção entre mandamentos cerimoniais e morais. Também não fazem, nem Jesus e nem os apóstolos, qualquer alusão ao decálogo como sendo a parte mais importante da Lei. Aliás, tal alusão fez Jesus a Levítico e Deuteronômio, pelo fato de conterem o maior de todos os mandamentos.
Sua transitoriedade
Ao apresentar Cristo como o fim da Lei, o Novo Testamento cumpre uma profecia de Jeremias: “Eis que dias vêm, diz o Senhor, em que farei um novo concerto com a casa de Israel e com a casa de Judá. Não conforme o concerto que fiz com seus pais no dia em que os tomei pela mão, para os tirar da terra do Egito... Mas este é o concerto que farei com a casa de Israel depois daqueles dias, diz o Senhor: Porei a minha lei no seu interior, e a escreverei no seu coração; e eu serei o seu Deus e eles serão o meu povo... porque todos me conhecerão, desde o mais pequeno deles até o maior, diz o Senhor; porque lhes perdoarei a sua maldade, e nunca mais me lembrarei dos seus pecados” (Jr 31.31-34).
Comentando esta profecia, o autor da Epístola aos Hebreus registra: “Dizendo Novo Concerto”, envelheceu o primeiro. Ora o que foi tornado velho, e se envelhece, perto esta de acabar” (Hb 8.13).
O antigo pacto estava sujeito a ser invalidado por uma das partes pactuantes: Deus ou Israel. É evidente que Deus foi fiel, enquanto os israelitas o transgrediram, o invalidaram, o violaram. Esta verdade esta registrada principalmente na Segunda Carta aos Coríntios, onde se afirma a transitoriedade da Lei e que “não somos como Moisés, que punha um véu sobre sua face, para que os filhos de Israel não olhassem firmemente para o fim daquilo que era transitório. Mas os seus sentidos foram endurecidos. Porque até hoje o mesmo véu esta por levantar na lição do Velho Testamento (ou concerto), o qual foi por Cristo abolido” (2Co 3.14).
O novo pacto, baseado na fé em Jesus, é incomparavelmente superior ao antigo:
a) Sua religiosidade independe de impulsos exteriores, pois brota espontaneamente de um coração perdoado e regenerado;
b) A vontade divina, testemunhada antes em tábuas de pedra, esta agora gravada nas tábuas de carne do coração;
c) O conhecimento de Deus, diferentemente de como era ministrado na velha aliança, torna-se, em Novo Testamento, uma experiência viva e profunda, magistralmente definida por Paulo nesta frase: “Mas nós temos a mente de Cristo” (1Co 2.16);
O concerto da Lei, portanto, era transitório. Os cristãos não estavam (e não estão) obrigados ao seu cumprimento, razão pela qual o apóstolo Paulo adverte: “Portanto, ninguém vos julgue pelo comer, ou pelo beber, ou por causa dias de festa, ou da lua nova, ou dos sábados”. A nova lei, sob a qual estão os crentes, é a “lei do espírito de vida, em Cristo Jesus”, (Cl 2.16).
Sua finalidade
Talvez em nenhuma outra passagem da Escritura o objetivo da lei esteja tão bem explicado como na carta aos Gálatas. O apóstolo Paulo pergunta para que é a Lei e responde: “Foi ordenada por causa das transgressões, até que viesse a posteridade a quem a promessa tinha sido feita; e foi posta pelos anjos na mão de um medianeiro”. E mais adiante: “De maneira que a lei nos serviu de 'aio', para nos conduzir a Cristo, para que pela fé fôssemos justificados. Mas depois que a fé veio, já não estamos debaixo do “aio” (Gl 3.19,24,25).
Do texto bíblico, e à luz de todo o contexto, percebe-se que a Lei, embora ordenada para o bem, não conseguiu justificar ninguém. Pelo contrário, foi alvo de muitas transgressões e culpas que deveriam levar os homens a conhecerem a sua própria miséria e importância e, partindo daí, humilharem-se diante de Deus, arrependerem-se e serem salvos mediante a fé (1Tm 1.8-17). Todavia, em si mesma a Lei não tinha poder algum para levar o homem a Deus: “E é evidente que pela Lei ninguém será justificado diante de Deus, porque o justo viverá pela fé” (Gl 3.11).
A Lei, portanto serviu aos israelitas, a quem foi dada como um pedagogo (a expressão original grega “paidagõgos”, (da qual se deriva pedagogo) que significa “tutor”. Refere-se a um tipo especial de escravo, também chamado de “aio”, cuja principal responsabilidade era acompanhar os filhos do seu amo na execução dos seus deveres escolares, bem como na sua formação acadêmica e cultural. Fazia parte de suas funções caminhar e seguir seus pupilos por todos os lugares, sempre zelando por sua educação e segurança (1Co 4.15)), até que a fé viesse. Mas depois que a fé veio, eles não estão mais sujeitos ao pedagogo (aio).
Argumenta ainda o apóstolo que a lei sinaítica, dada 430 anos depois de Abraão, não invalidou a promessa de Deus feita àquele patriarca. “Mas a Escritura encerrou tudo sob o domínio do pecado, a fim de que a herança prometida fosse dada aos crentes por virtude da fé em Jesus Cristo” (Gl 3.22).
Cristo, o único a cumprir plenamente toda a Lei através de uma obediência perfeita, tornou-se “mediador de uma nova aliança, para que, tendo intervindo a morte para a redenção das transgressões que havia debaixo da primeira aliança, os que têm sido chamados recebam a promessa da eterna herança” (Fp 2.5-8; Hb 9.15).
Bibliografia: Texto de Abraão de Almeida – Revista A Seara, Nº 164, Novembro, Ano 1978, XXIII, Cáp 2 e 3.
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