A
prioridade do discipulado
Mateus
8.18-22 (Versão King James)
Quando
Jesus viu que uma multidão o rodeava, ordenou que atravessassem para o outro
lado do mar. Então, aproximando-se Dele um escriba, disse-lhe:
-
“Mestre, seguir-te-ei para onde quer que fores”.
Jesus
lhe respondeu:
- “As
raposas têm suas tocas e as aves do céu têm seus ninhos, mas o Filho do homem
não tem onde repousar a cabeça”.
Outro
de seus discípulos lhe disse:
-
“Senhor, permite-me ir primeiro sepultar meu pai”.
Ao
que Jesus lhe respondeu:
-
“Segue-Me e deixa que os mortos sepultem os seus próprios mortos”.
Ao
ler as Escrituras Sagradas de forma superficial, corre-se o risco de se
entender/compreender certas passagens da Bíblia de forma equivocada, pois a
maioria dos textos de difícil interpretação ao leitor tem seu contexto em
harmonia com uma cultura-social ou tradições religiosas concernentes há uma
época muito diferente dos dias atuais. É necessário entender a época, a
cultura, as tradições dos tempos de Jesus para que se compreenda corretamente o
contexto das Escrituras, e assim, compreender o que realmente o Senhor estava
dizendo e ensinando na ocasião. Caso contrário, pode-se interpretar de forma
errada as palavras de Jesus. Ao ler os Evangelhos de Mateus (8.18-22) e Lucas (9.59-62),
por exemplo, tem-se a impressão de que as palavras do Senhor Jesus soam demasiadamente
“ásperas”.
Conforme entendido por alguns leitores modernos, a aparente negativa de Jesus
mostra-se tanto irracional quanto desnecessariamente severa!
O
texto aqui estudado (Mateus 8.18-22) tem, criado diversas divergências de opiniões
entre os estudiosos, pois cada qual defende uma interpretação, que quase
sempre, esta distante do real significado contextual bíblico, ou contraditória
a outros textos em concordância.
Alguns
comentaristas tentam atenuar esta declaração do Senhor, interpretando-a como “deixe
os ‘espiritualmente’ mortos enterrarem os ‘fisicamente’ mortos”, mas
essa interpretação estaria contradizendo o quinto mandamento da lei mosaica,
que diz: “Honra a teu pai e a tua mãe...” e também a responsabilidade
judaica de providenciar um sepultamento apropriado conforme ordenado em
Deuteronômio 21.22,23.
Exegese
do texto
Primeiramente
parte: Mateus 8.19,20.
Quando
Jesus viu que uma multidão o rodeava, ordenou que atravessassem para o outro
lado do mar. Então, aproximando-se Dele um escriba, disse-lhe:
-
“Mestre, seguir-te-ei para onde quer que fores”.
Jesus
lhe respondeu:
- “As
raposas têm suas tocas e as aves do céu têm seus ninhos, mas o Filho do homem
não tem onde repousar a cabeça”.
No
Evangelho segundo Mateus (8.19) é esclarecido que a pessoa que se dirigiu
primeiramente ao Senhor era um “escriba”. O motivo pelo qual Mateus
identifica este escriba esta no principal objetivo do seu Evangelho, que é para
o publico judeu. Em seu Evangelho,
Mateus relata seu testemunho pessoal sobre o fato de Jesus Cristo ser o Messias
prometido no AT, cuja missão messiânica era trazer o Reino de Deus a
humanidade, sendo primeiramente aos judeus. Por isso Mateus cita várias
passagens e profecias do AT e, de fato, interpreta essas profecias como tendo
absoluto e certeiro cumprimento em Jesus Cristo; sendo que, tudo foi escrito e
ensinado de um modo que os judeus de sua época (século I) compreendessem,
através de provas irrefutáveis!
Ao
citar um “escriba”, Mateus visa mostrar o ensinamento de Jesus a respeito
da seriedade da escolha em segui-Lo. Não
é por acaso que Jesus respondeu a declaração deste escriba dizendo: “As
raposas têm suas tocas e as aves do céu têm seus ninhos, mas o Filho do homem
não tem onde repousar a cabeça” (versão King James). Em várias
passagens do Evangelho segundo Mateus, é nos dado uma compreensão do porque Jesus
deu esta resposta ao escriba. Os escribas eram conhecidos por seu apego
religioso as tradições, invalidando assim a Palavra de Deus (Mateus 15.1-9).
Jesus também denunciou publicamente a religiosidade destes quanto a sua postura
orgulhosa e contraditória diante do que ensinavam. Na época de Jesus estes eram
dominados pela vaidade, pois tudo o que realizavam tinha como meta serem
observados pelas pessoas. Buscavam o reconhecimento das pessoas, faziam questão
de serem bajulados e reconhecidos como mestres (Mateus 15.5-7). Também foi
denunciado o modo como se exploravam seus respectivos status diante do povo
para aproveitar-se das pessoas (Mateus 15.14), e principalmente o modo como
formavam prosélitos tendo como meta muito mais a pratica de suas tradições
religiosas do que a da Palavra de Deus (Mateus 15.15-28). Isso tudo era
contrario aos ensinamentos de Jesus (Lucas 14.7-24).
Resumindo,
quando o escriba declarou: “Mestre, seguir-te-ei para onde quer que
fores”, não estava levando em conta toda a renúncia que teria de fazer
para tomar tal decisão. A renúncia deste era o desapego a sua vida, as suas
tradições, status e luxo. Quando este
escriba viu a “multidão” que se reunia diante de Jesus provavelmente ficou
tomado por intenções egoístas e não altruístas. Por isso, a resposta do Senhor
Jesus mostrava que a meta de Sua missão não era viver regaladamente,
aproveitando-se do povo (Leia: Lucas
14.27-33)!
Segunda
parte: Mateus 8.21,22
Outro
de seus discípulos lhe disse:
-
“Senhor, permite-me ir primeiro sepultar meu pai”.
Ao
que Jesus lhe respondeu:
-
“Segue-Me e deixa que os mortos sepultem os seus próprios mortos”.
Como
foi dito no início deste estudo, ao ler de forma superficial esta passagem das
Escrituras, sem levar em conta a cultura-religiosa daquele século, o leitor
moderno terá a impressão de que a resposta de Jesus a esta pessoa foi um tanto
“áspera”,
dando a entender certo desrespeito para com os pais, contrariando a lei mosaica
(Deuteronômio 21.22,23).
Os
Evangelhos que citam este evento (Mateus e Lucas), [...] deixa que os mortos sepultem os seus próprios mortos. Colocam as
palavras num contexto em que certos discípulos explicavam o porquê de não
poderem deixar de imediato as suas respectivas situações para seguir a Jesus.
Nesse exemplo específico, um discípulo pediu permissão para ir primeiro
enterrar o seu falecido pai. Conforme entendido pelos leitores modernos, a
aparente negativa de Jesus mostra-se demasiada indiferente ao mandamento de
honrar aos pais, como também muito severa.
Todavia,
quando interpretados à luz da informação arqueológica concernente às praticas
de sepultamento do primeiro século judaico, o pedido do discípulo e a resposta
de Jesus podem ser vistos sob uma ótica muito diferente. O enterro judaico no
tempo de Jesus consistia na verdade de dois sepultamentos e o (segundo)
acontecia pelo menos um ano depois. O primeiro sepultamento era conhecido como
ser “reunido aos seus pais”, era dentro da cova da família, seguido por um
período de pranto (luto). O segundo sepultamento ocorria aproximadamente dentro
do prazo de onze a doze meses depois, era posto dentro de uma caixa de ossos
(ossuário), geralmente com os resquícios de outros membros da família, quando
já a carne estava decomposta.
O
que parece estar em foco nesta passagem do Evangelho segundo Mateus (e também
em Lucas) é o segundo sepultamento, conhecido como “ossilegium”. A resposta
de Jesus ao discípulo que desejava uma licença de quase um ano antes de iniciar
o serviço de pregar o Evangelho, não se referia apenas à prolongada ausência,
mas especialmente ao aspecto “não-bíblico” do segundo
sepultamento.
O
sepultamento imediato (“reunir-se aos seus pais”) é retratado na Bíblia em
várias passagens (Gênesis 49.29; Juízes 2.10; 16.31; 1Reis 11.21,43), mas nos
tempos do NT esse conceito havia adquirido um outro significado teológico. De
acordo com fontes rabínicas, o ato da decomposição tinha um efeito purificador,
fazendo expiação pelos pecados do falecido. A consumação desse processo
espiritual era o ritual do segundo sepultamento. Uma vez que Jesus seguia o
ensino bíblico de que somente Deus faz expiação dos pecados (sobre a base da fé
na redenção sacrificial [...]), Sua declaração corrigia essa prática imprópria.
Sendo
assim, poderíamos então interpretar as palavras em Mateus 8.22 (e em Lucas 9.60)
[...] como: “Olhe, você já honrou o seu pai dando-lhe um sepultamento apropriado na
tumba da família. Agora, ao invés de esperar que a carne se decomponha, o que
não pode expiar o pecado, vá pregar o Evangelho do Reino de Deus [...] o único
meio de expiação. Deixe os ossos dos ancestrais de seu falecido pai reunirem-se
aos dele no ossuário! Quanto a você, siga-Me!”
O
primeiro discípulo, um escriba, tinha de renunciar seu status, suas tradições,
seu luxo, para viver de forma altruísta, seguindo ao Senhor. O segundo discípulo
tinha de abrir mão de suas tradições-religiosas (não-bíblica) a respeito do
segundo sepultamento de seu pai, para seguir o Senhor Jesus.
Cada
qual obteve uma resposta do Senhor a respeito da prioridade do discipulado, em
se pregar o Evangelho do Reino de Deus, abrindo mão de algo considerado
importante para si. As Escrituras não relatam a decisão destes discípulos, mas nos
mostra não só a seriedade da decisão que temos de tomar, como também, a
prioridade em seguir o Senhor, levando em conta a renúncia que esta escolha nos
trará.
Para
cada escolha há uma renúncia, se não houve renúncia é porque não houve uma
escolha!
Bibliografia
Bíblia
Sagrada: King James (versão Poética);
Arqueologia
Bíblica, Reedição do livro Pedras que Clamam. Editora CPAD, Autor Randall
Price.
Bom dia.
ResponderExcluirA paz do Senhor Jesus.
Muito esclarecedor.
Obrigado.
Deus abençoe! !